‘Ensinagem’ é o ópio da educação

Ópio: aquilo que serve de paliativo ou que provoca adormecimento ou embrutecimento moral.

 

O sistema educacional no Brasil é tradicional e conteudista. Em resumo, o professor é o detentor do saber e responsável por transmitir o conteúdo para o aluno, que deve retê-lo em sua memória e normalmente essa retenção dura até a data da prova, quando chega o momento de reproduzi-lo.

O que é mais fácil?

1 – O professor dar a resposta pronta para a solução do problema?

OU

2 – O professor criar oportunidades para que o aluno entenda o processo para solucionar vários problemas?

1 – Quando o professor ensina, ele dá a resposta pronta e isso gera muitas vantagens:

– O aluno viciado na inércia adora respostas prontas, pois ele não precisa pensar, basta reproduzir o que o professor falou e será um aluno nota 10.

– O professor que dá a resposta pronta é tido como inteligente e um professor bem legal, pois facilita a vida do aluno.

– Esse processo suave e agradável não gera aprendizagem. Ele gera alunos inábeis, dependentes, acomodados e incapazes de desenvolver um pensamento crítico e complexo.

2 – Quando o professor não dá a resposta pronta, ele gera conflitos:

– O aluno resiste à ideia de pensar, pelo simples fato de que pensar dá fadiga. Ele fica irado, pois não quer aprender caminhos para solucionar qualquer problema, ele quer apenas a resposta imediata para aquele problema.

– O professor que não dá a resposta pronta é tido como incapaz e ineficiente, pois ao invés de solucionar o problema imediato, ele faz perguntas, apresenta caminhos e incentiva o aluno a buscar autonomamente uma solução.

– Esse processo ríspido e cansativo gera aprendizagem efetiva, pois o aluno tem que se esforçar, e por consequência se percebe capaz de produzir, inovar, encontrar soluções de forma autônoma e gerar um pensamento crítico e complexo.

Em um momento de desabafo, minha querida amiga Regina Pundek, uma admirável educadora revela:

“CÁTEDRA solitária e arrogante – “ferrados” e mal pagos.

Uma Escola que é feita PARA os estudantes e não COM eles.

Quando é que vamos entender que APRENDER é uma condição de todo ser vivo independente de SER ENSINADO? Quando é que nós adultos responsáveis vamos entender que projetar um futuro PARA as crianças e jovens vai mantê-los na mesma situação em que nos encontramos, retirando-lhes a responsabilidade pelo próprio viver e tornando-os dependentes e obedientes do viver que lhes preparamos?”

O processo de ‘ensinagem’ vem ganhando muitos paliativos lindos e bem tecnológicos. É a troca do giz e lousa por computadores modernos, lousas digitais, smart TVs, games interativos, quizzes divertidos, aula invertida, mas o processo continua com a mesma essência arcaica: o professor como o detentor do saber e o aluno o memorizador ambulante de conteúdos fragmentados.

O professor precisa parar de ensinar –  Sempre que digo essa afirmação provocativa, escuto na sequencia: Se o professor parar de ensinar o que ele fará? Como os alunos aprenderão?

Os alunos não estão aprendendo com a ‘ensinagem’, se estivessem aprendendo, o Brasil não estaria entre os 10 piores no ranking mundial de educação – PISA.

Se ensinar não resulta em aprendizagem, por que insistimos tanto na ‘ensinagem’?

1 – ARROGÂNCIA – Viviane Mosé ao falar para professores do “Estrada para Cidadania”, cita uma fala de Nietzsche, que para provocar os poetas disse que eles turvam as águas para parecerem profundas, para que não se possa ver a falta de conteúdo que eles tem, e assim, Viviane Mosé faz um paralelo com os professores universitários.

2 – ISOMORFISMO – (ou Síndrome da Gabriela) – Outro fator que influencia na perpetuação da ‘ensinagem’ é o isomorfismo. Como disse o querido amigo e mestre José Pacheco: “há um principio na formação que se chama Isomorfismo. O modo como o professor aprende é o modo como o professor ensina.”

3 – IGNORÂNCIA –  No processo da ‘ensinagem’ é estimulado a memorização dos saberes fragmentados. Memorização não é aprendizagem. O admirável professor Rubem Alves dizia que o aprendido é aquilo que fica depois que o esquecimento fez o seu trabalho e que as avaliações de aprendizagem, deveriam acontecer um ou dois anos depois de ensinado.

Pode maquiar a ‘ensinagem’ com a tecnologia que quiser, ela continuará sendo ineficiente e insuficiente, pois quando muito, fala apenas do que foi [sem desmerecer as contribuições] e que no ambiente passado deu certo. O aluno tem que se preparar para o que virá: O futuro! Para isso, precisa ser estimulado para pensar de forma autônoma em busca de alternativas de soluções.

“Ensinar não é transferir conhecimento, mas criar as possibilidades para a sua própria produção ou a sua construção.” [Paulo Freire]


Quanto tempo mais será necessário para os professores perceberem que seu papel não é mais de transmitir conhecimento, mas de um mentor, mediador, tutor ou orientador?

Até quando o objetivo das instituições educacionais não será a aprendizagem do aluno?

Vídeo recomendado – Viviane Mosé – A escola e a vida: